Vitrolinha – Para Ouvir no Trem
Estes dias estive em Bruxelas num encontro de Direitos Humanos entre a União Européia e o Brasil. Fui falar sobre o trabalho com migrantes na prevenção ao trabalho escravo e tráfico de pessoas.
Antes de ir, o Bruce, um amigo muito querido disse: “eu desejo que aconteçam várias coisas surpreendentes.” Era tudo o que eu queria ouvir, porque o que eu gosto mesmo é de coisas surpreendentes.
A maioria dos mortais não aaaaamam o seu trabalho. Ou pelo menos não o tempo todo. Como todas as coisas da vida. Bom, eu gosto muito do que faço na ONG, mas se pesar na balança as coisas ruins e boas, elas ficam bem divididas.
Mas às vezes pinta uns encontros destes, que podem ser na Europa ou em Cajamar, mas a possibilidade de trocar idéias com pessoas interessantes é bem grande, e isso é um ganho no meu trabalho que eu não tinha computado no que chama o tio Helio, de “salário indireto”.
E estes dois dias intensos, com várias pessoas interessantes, foram tão legais. Procurei sugar ao máximo do conhecimento de todas as pessoas, mas não só na hora do seminário, mas também no chá, no almoço, nos debates do corredor, nos queijos, nas (muitas) cervejas e no vinho.
Por outro lado, quando eu viajo, eu adoro ficar sozinha. Gosto de ficar sozinha com o mundo. Tenho meu ritmo, meu jeito, que é gostoso dividir também, claro, mas eu me concentro tanto na viagem, que a cidade acaba virando a minha companheira.
E eu resolvi ficar um dia a mais do que as outras pessoas. E fui para o local que todo mundo me falava para visitar na Bélgica: Brugge. Uma hora de trem de Bruxelas, é a capital de Flandres, medieval, com canais pela cidade. Adorei, era respirar pura história, era como me transportar para as aulas do Recco. E por conta do outono as folhas das árvores estavam no ápice das mudanças de cor.
O Ipod foi um super companheiro nesta viagem. Meu ritual é sempre começá-lo no aleatório até parar em alguém que eu queira ouvir o disco todo. Mas numa conjunção só explicado por cálculos matemáticos, ele separou uma seleção tão bacana que saquei um caderninho para escrevê-la. E foi assim:
A primeira foi Caminho da Roça, da Banda Black Rio. Nada mais sugestivo para a minha viagem de trem, do que pegar o caminho da roça. Uma música para olhar pela janela mesmo:
Depois foi Celestial Flowers do João Donato, uma das minhas preferidas do “A Bad Donato”. Com aquele órgão que virou referência para as a música brasileira. Este disco (1970) é tão incrível, e teve a participação de um pessoal tipo Bud Shank e Oscar Castroneves. Uma pedrada.
Num golpe sujo do Ipod, veio Do it Twice do Bob Marley. A música que mais ouvi nestes dois últimos meses, apareceu para me fazer companhia na viagem.
Como se fosse possível continuar bom, a próxima foi Funkier Than a Mosquito’s Tweeter, da Tina e Ike Turner. Nesta altura eu já estava muito empolgada, dançando sozinha.
Quando começou Kelly Watch the Stars, do Air, encostei na poltrona, abri um sorriso e fiquei cantando junto com os sintetizadores.
Até pensei em deixar neste disco do Air, o “Moon Safari”, mas resolvi apostar na próxima. Quando o Seu Jorge começou a falar: “my life my life my life”, na introdução de Everybody Loves the Sunshine, dele e do Almaz, devo ter gritado um uhuuuul
Inesperadamente depois desta veio Pula Pula Pipoquinha, música que a escolinha do Tom teve que me mostrar, porque era uma das preferidas dele e eu não tinha ouvido, e como estava no computador deve ter sincronizado.
Já tinha abusado da sorte. Então voltei para o disco do Almaz, que acho que nunca tinha ouvido inteiro, projeto do Seu Jorge junto com o Antonio Pinto, Lucio Maia e Pupilo tocando Tim Maia, Jorge Ben, Michael Jackson e Nelson Cavaquinho, Kraftwerk entre outros. Foi a exata medida para o trem chegar.