Dose dupla: Sorvete crocante de pecãs com flor de sal + Bananinhas caramelizadas com laranja
Quem acompanha o blog deve ter percebido que não sou muito de doces. Posto poucas receitas e em geral faço poucas doçuras. Mas de quando em vez decido desvendar uma técnica e correr atrás de um preparo até ele ficar bom.
Essa tem sido minha história com sorvete. Aprendi a fazer quando estudava gastronomia, algum tempo depois comprei uma máquina e fiz alguns, mas não gostei do resultado. Em geral ficavam doces demais e vira e mexe eu errava a textura. Se eu ficava frustrada por um lado, nunca arrumava tempo para me debruçar sobre o assunto para pensar e depois fazer, fazer, fazer anotando o processo e analisando cada resultado, como sempre faço nestes estudos.
Eis que fui preparar um jantar para a família e decidi que a sobremesa seria sorvete, as pecãs estavam ótimas e com bom preço, eu adoro caramelo salgado, decidi fazer um crocante de pecãs com toque de sal. Revi receitas, alterei o açúcar, meti as caras e ficou sensacional. Minha amiga Evane disse que era a melhor coisa que ela já tinha comido feito por mim… o que me deixou um bocadim #chatiada… Como assim, meu melhor preparo é um doce? Por acaso sou doceira? rsrsrsrs
Mas também fiquei com o Sr. EGO ronronando de alegria com o elogio… Novo jantar em casa, resolvi me exibir e fazer novamente o sorvete. Mas foi um dia caótico, cheio de gente na cozinha, muitos amigos, uma taça de vinho nas mãos, várias pausas para prosear (e uma ambição desmedida da louca aqui que decidiu fazer de uma tacada só, e sozinha, massa caseira+ragú+sorvete E tarte tatin!), descuidei da base do sorvete e talhou, resultando em uma textura com pequeninos e indesejáveis grumos. Fiquei p. da vida, mas aí virou questão de honra.
Mergulhei no assunto. Refiz. Duas tentativas depois, consegui exatamente o resultado que encantou minha amiga. Fiquei tão feliz que aproveitei o cacho de bananinhas ouro que comprei na subida da praia e fiz as danadinhas caramelizadas com laranja prá acompanhar. Casamento perfeito e com toda pompa e circunstância!
Ficou com vontade? Segue o caminho das pedras:
Como são dois preparos que só se juntam no final, vou separar a receita em duas partes: uma dose dupla de sobremesas!
Tanto uma como outra você pode servir junto ou separadas. Em dias de preguiça faça a banana que é bem rapidinha e sirva com sorvete comprado, e deixe o sorvete para os dias de mais animação e tempo (ou aqueles dias em que vc quer impressionar os comensais).
E vamos começar pelo mais complicado, que é o sorvete.
Ingredientes
Caramelo de noz pecã
- 1 xícara (chá) de açúcar demerara
- 1 xícara (chá) de pecãs picadas grosseiramente
- 2 colheres (sopa) de manteiga sem sal
- 1 colher (sopa) de mel
- 1 colher (chá) flor de sal
Base
- 500 ml de leite integral (de preferência não use longa vida)
- 500 ml de creme de leite fresco
- 6 gemas
- 150 g de açúcar refinado
Modo de fazer
Caramelo
Em uma sauteuse de fundo grosso derreta o açúcar com a manteiga. Acrescente o mel mexendo sempre até transformar em caramelo.
Juntes as nozes pecãs, misture bem e fora do fogo acrescente a flor de sal.
Deixe esfriar (vai ficar parecido com um pé de moleque) e então solte do fundo com a ajuda de uma espátula de madeira.
Quebre as placas de caramelo com um martelo ou passe pelo processador no modo pulsar, tomando cuidado para não transformar em pó. O caramelo deve continuar com pequenos grumos mas apenas do tamanho suficiente para não quebrar o dente de ninguém. Evite os grumos muito grandes.
Base
Divida o açúcar em duas partes. A primeira metade leve ao fogo junto com o leite e creme de leite e deixar ferver.
A outra metade do açúcar bata com as gemas até dobrar de volume e obter uma mistura amarela bem clara.
Continue batendo e junte à mistura de gemas um pouco do leite quente da panela, mexendo sem parar! – CUIDADO: é a partir daqui que a gente corre o risco de talhar a mistura.
Volte tudo para a panela em fogo baixo e continue a mexer até obter a consistência de nappé leve, que é o ponto em que a mistura cobre levemente as costas de uma colher.
(Pausa para mantra: cuidado para não talhar, cuidado para não talhar, CUIDADO para não talhar… repete comigo!!!)
Retire do fogo e deixe esfriar.
Quando a mistura estiver fria coloque na sorveteira e ligue. Ajuste o timer para 40 minutos.
Aí entra a segunda dica importante: se você tem uma sorveteira caseirinha como a minha, com uma tigela congelada (que fica no freezer), o truque é fazer uma pausa no meio do tempo de preparo, abrir a sorveteira e com a ajuda de uma espátula soltar o sorvete que se forma nas bordas e no fundo.
Isso acontece porque a mistura em contato com a superfície da tigela congela mais rápido que o restante, e se a gente não solta essa parte ela vai atrapalhar o restante e gerar duas consistências diferentes (e uma sensação de cristais de gelo). Quando soltamos essa parte mais dura o resultado é um sorvete com textura uniforme e cremosa.
Nos últimos 10 minutos acrescente o caramelo crocante e está pronto!
Passemos para nossas bananinhas…
Ingredientes -4 porções
- 10 bananas ouro partidas ao meio no sentido do comprimento – ou 4 bananas nanicas
- 1 xícara(chá) de açucar demerara
- 1 colher (sopa) de manteiga
- suco de 1/2 laranja
- 1/2 dose de conhaque
Modo de fazer
Derreta o açúcar com a manteiga em uma sauteuse de fundo grosso até que se transformem em um caramelo. Acrescente as bananinhas e logo em seguida o suco de laranja.
Misture com delicadeza de maneira que as bananas fiquem envoltas pelo caramelo.
Acrescente o conhaque e faça a flambagem inclinando levemente a sauteuse para roubar o fogo da chama do fogão. Prontinho!
Podem ser servidas quentes ou frias.
Montagem
Em um prato fundo disponhas as metades de banana harmoniosamente, acrescente o sorvete generosamente e se lambuze efusivamente…
Bom apetite!
Harmoniza com… por Marcelo Pedro (No Copo) e Marina Novaes (Na Pick’up)…
A sorveteira que compramos por uma bagatela, já que não é nada mais que um batedeira com uma tigela de parede dupla com gel congelado no meio, foi uma grata surpresa. E como compramos numa promoção, ganhamos uma segunda tigela, “de grátis”, o que possibilita fazer duas receitas de sorvete de uma vez. E este sorvete é tão bom que sempre é bom garantir o repeteco! E bananas caramelizadas, ainda mais banana ouro, como as que a Léti usou ficam esplendidas com sorvete.
Para harmonizar vou ser mais ou menos tradicional, e vou falar um pouco de vinhos de sobremesa. Mas não vou ser óbvio e falar de Sauternes franceses ou Tokaji 3 ou 5 putonoyos, que são excelentes, mas que no Brasil têm preço deveras salgados. Também não vou apelar pros vinhos argentinos, chilenos e mesmo brasileiros de colheita tardia, porque os poucos que experimentei não me emocionaram. Achei-os pesadões, pouco ácidos, e acidez é essencial para equilibrar a doçura da sobremesa. Minha recomendação é um Icewine canadense!
O Canadá é hoje o maior produtor destes vinhos, apesar de que os Eiswein alemães, são mas famosos e pioneiros. Diferente do Sauternes e Tokaji, as uvas não tem que estar apodrecidas com o fungo Botrytis, responsável pela “podridão nobre” que concentra os açúcares das uvas. Os vinhos do gelo só podem ser produzidos em países com inverno rigoroso, quando as uvas maduras congelam nas videiras, são colhidas manualmente e tem o suco com alta concentração de açúcares extraídos ainda com as uvas congeladas. O problema, é que como as uvas ficam nas videiras maduras além da época da colheita habitual, se não congelarem, apodrecem, e não tem Icewine. Para isso, a temperatura tem que estar abaixo de 7 ou 8oC, o que ocorre no começo do ano, após o ano novo no hemisfério norte.
E aí no Canadá, com sua vasta extensão de terras geladas, este tipo de vinho foi desenvolvido a tal ponto, que não só bateram os alemães em volume, como alguns críticos até os reputam melhores que os germânicos. A principal uva para o Icewine é a Riesling, mas no Canadá também se utiliza a variedade Vidal. Eu ganhei um Icewine de um amigo que ficou um ano no Canadá, em Toronto, na província de Ontário, justamente a principal região produtora. Adorei! E o melhor é que o preço não é tão caro quanto o dos alemães.
Prost ou cheers!
Às vezes não consigo não pecar pelo óbvio, e essa ‘dose de dupla’ combina com músicas de amor. A primeira, para este casamento quente frio, Caso Sério da Rita Lee e Roberto de Carvalho.
O casal sensação dos anos 80, em sua fase super pop e de enorme empatia popular, embalaram muitos hits fofos e de amor, e este sorvete de pecãs com bananas caramelizadas é a uma bela definição do empapuçados de amor:
Continuando no tema, e compartilhando uma das canções de amor aqui de casa, ouça Feist, Inside and Out, enquanto mexe sem parar para chegar no nappé.
A cantora canadense, que também faz parte da bacanuda banda indie Broken Social Scene, em 2005 fez esta cover do Love You Inside Out do Bee Gees (que é boa pra caramba). Acho uma delicia de dançar juntinho ou separado mesmo, e na verdade tenho até uma coreografia secreta ;)
Para a banana caramelizada com laranjas, o grand finale, simples e deliciosa, coloque um rock fofo, daqueles com coraçõeszinhos no ar Com Um Pote de Geléia de Morango Nas Mãos, do Luisa Mandou um Beijo.