Comida Feminista – O barreado da Mara Sales
Já na primeira garfada me encantei pela comida da Mara Sales, chef do Restaurante Tordesilhas (www.tordesilhas.com.br), comida brasileira de verdade, boa de doer, cheia de referências e muita pesquisa envolvida em cada prato, de diferentes regiões do Brasil.
Pois bem, eu que já admirava a comida, não imaginava que a mulher por trás, Mara, fosse tão encantadora! Tive duas aulas com ela quando fiz o Curso Objetivo Chef na Wilma Kövesi, aliás, mais que aulas, foi um mergulho em minhas raízes culinárias, parecia que estava ouvindo minha avó Maria falando, ensinando… isso sem falar nos ingredientes… pequi, guariroba, pimenta de bode, jambú, tucupi… coisas que enchem minha boca d´água, principalmente porque por essas bandas de cá, são ingredientes que a gente só encontra se souber procurar bem…
Mas de tudo que ela ensinou naquelas aulas, um prato me deixou especialmente emocionada, o Barreado. Trata-se de um prato açoriano, difundido no país por imigrantes que se fixaram no Paraná.
Segundo Mara, “O principal charme desse prato está na forma de preparo. Além de deixar a carne extremamente macia, o cozimento lento, de no mínimo 12 horas, é um verdadeiro ritual. O nome vem do “lacre” feito com farinha de mandioca e água usado para vedar a panela, que deve ser aberta apenas na hora do consumo.”
Originalmente, ele era feito enterrando-se a panela em solo vulcânico e deixando o cozimento da carne por conta do calor do próprio solo, criando-se assim uma panela de pressão primitiva.
Na aula, Mara nos contou ainda uma das histórias para a origem do prato: era servido em Açores em dias de festa (não me recordo agora que festa) e foi uma criação das mulheres, que pensaram em uma solução que lhes permitisse também participar dos festejos em lugar de passarem todo o tempo na cozinha. Criaram então esta forma de cozimento lento, assim elas festejavam enquanto a comida cozinhava no seu tempo e sem necessidade de supervisão! Uma legítima comida feminista: libertária e independente, você coloca os ingredientes na panela e ela se vira!
Brincadeiras à parte, a festa mesmo acontece quando o lacre de farinha é rompido e a panela é aberta. Imediatamente todo o ambiente fica mergulhado no delicioso aroma do cozido… o mais legal é perceber que, devido ao lacre, todos os nutrientes e sabores ficam ali, presos na panela, para depois serem libertados como um gênio da garrafa… a carne fica tão macia que vc pode amassá-la com o garfo e misturá-la com o caldo e a farinha formando um portentoso pirão… aiaiai…
Preciso confessar, diante deste espetáculo fiquei de olhos mareados, com cara de idiota, tentando esconder as lágrimas da turma, tudo para não passar atestado de doida… chorar em fim de novela, ok! mas chorar por conta de comida, melhor disfarçar, né? Mas a verdade é que foi difícil manter o controle diante de uma prato tão cheiroso e cheio de história!
E se você também ficou com água na boca e com vontade de repetir esta experiência em casa, segue a receita da Mara Sales:
Barreado